30/05/2023 – 22:29
Billy Boss/Câmara dos Deputados
Agostinho: “Existe uma opção deliberada pela judicialização de alguns temas”
Mais de 7 anos e meio depois do crime socioambiental provocado pelo rompimento da barragem do Fundão em Mariana (MG), 60% dos 42 programas compensatórios e reparatórios apresentam índice baixo ou muito baixo de implementação. Dos R$ 31,1 bilhões previstos em ações de reparação até 2030, foram executados R$ 23,5 bilhões. Já nas ações de compensação, foram aplicados apenas R$ 747 milhões dos R$ 3,4 bilhões previstos. Os números foram apresentados pelo presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, nesta terça-feira (30), durante audiência da comissão externa da Câmara dos Deputados que acompanha os desdobramentos do rompimento da barragem na região.
O crime ocorreu em novembro de 2015, deixou 18 mortos e um lastro de rejeito de minério de ferro até a foz do Rio Doce, no Espírito Santo. O Ibama comanda o Comitê Interfederativo (CIF), responsável pela governança dos programas reparatórios e compensatórios que deveriam ser executados pela Fundação Renova, representante das mineradoras. Rodrigo Agostinho identificou os principais obstáculos nesse processo.
“Existe uma opção deliberada pela judicialização de alguns temas, uma judicialização excessiva. Então, o que a gente tem ali é um ciclo que se repete pela interferência das mineradoras na Fundação (Renova), que não permite a identificação de danos, modificando o plano de atividade de orçamento. E, no final, o que a gente tem é baixa no desempenho geral”, explicou.
Dos 42 programas socioambientais e socioeconômicos previstos no Termo de Transação e de Ajustamento de Conduta (TTAC) assinado em março de 2016, 10 foram parar na Justiça. Na execução dos demais programas, Agostinho avalia que a Renova, sob orientação das mineradoras, prefere ser multada do que implementá-los. Desde que foi criado, o Comitê Interfederativo aplicou 81 notificações e 19 multas à Fundação Renova. Diante do que chamou de “fracasso do Estado ao lidar com o ecocídio” de Mariana, Rodrigo Agostinho se manifestou favorável à tentativa de repactuação dos acordos reparatórios, conduzida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No entanto, o presidente do Ibama alerta quanto à necessidade de garantia de participação dos atingidos nessa governança, como acontece na gestão atual do CIF.
“Ele (CIF) sozinho é insuficiente para resolver todos os problemas e demandas de governança. Mas, temos essa instância. Na repactuação, a gente não sabe qual instância será colocada no lugar. Precisamos de uma instância de governança com participação principalmente da população atingida”.
Billy Boss/Câmara dos Deputados
Rogério Correia, coordenador da comissão externa
Segundo Agostinho, o governo federal ainda analisa pontos específicos da repactuação dos acordos de Mariana. Há cuidado, por exemplo, em evitar que as mineradoras troquem a atual obrigação de reparar e compensar pela obrigação de apenas pagar a terceiros. O coordenador da comissão externa, deputado Rogério Correia (PT-MG), manifestou preocupação semelhante.
“O que eles querem, por exemplo, é ficar com a responsabilidade pelo rejeito, com todas essas polêmicas se pode tirar o rejeito ou não . Todo o restante entraria no acordo em que a Vale pagaria para que outros fizessem. Eu acho extremamente arriscado um tipo de governança que seja essa”, alertou.
Com base em estudos técnicos, o Ibama constata deposição, remobilização e biodisponibilização dos rejeitos de minério de ferro ao longo do Rio Doce, com reflexos na cadeia ecológica. Ainda há dúvidas quanto à melhor solução para a retirada dos poluentes do leito do rio: pode-se tentar usar técnicas de dragagem, encapsulamento ou até deixar tudo como está, para não movimentar os rejeitos e realimentar a poluição.
Reportagem – José Carlos Oliveira
Edição – Ana Chalub